3 de abril de 2020

Tragédia dentro da tragédia (por Lenilda Lima*)

Meninas, hoje é um dia que estou destroçada. A nossa história foi alterada do seu rumo natural sem que pudéssemos ter o último momento de despedia. Não tive o direito de olhar pela última vez aquela que foi a casa da lutas, das grandes transformações sociais e políticas. O começo da história da organização das professoras primárias APP – Associação das Professoras Primárias, mais tarde evoluindo para Associação dos Professores de Alagoas – APAL.

Foi no velho casarão Vila Amália que, de uma associação quase mutualista, surge uma organização classista, partícipe das maiores lutas políticas desse país, por bandeiras democráticas, pela universalização do ensino, gestão democrática, recursos públicos exclusivos para a Escola Pública, fundos públicos, piso, carreira, entre tantos outros.

Olhando para trás, impossível não lembrar da participação da construção do PNE – Plano Nacional de Educação,  e as inserções na construção do PEE – Plano Estadual de Educação e PMEs – Planos Municipais de Educação, destacando a contribuição da professora Sandra Lira, colaboradora e parceira fundamental durante todos esses anos.

Quantas lutas políticas… greves, elaboração de dossiês da Educação, negociações e conquistas para a nossa categoria. Trazemos a marca de um Estado que através da sua organização sindical conquistou o maior número de Plano de Cargos e Carreiras com a participação efetiva do professor Milton Canuto. Sempre tendo um posto de comando, um prédio histórico, num bairro histórico, um dos mais antigos de Maceió, que além de trazer em si uma parte do resgate da nossa história, é detentor de uma beleza contrastante e única.

Lá renovávamos a nossa força e nos inspirávamos nos que nos antecederam, sempre nos reinventando. Junto com essas memórias, reverenciamos quem foi para outro plano… salve, salve Renilda, nossa querida Rena! Jarede Viana, eterna colaboradora e fonte de inspiração pela sua criatividade e espírito inquieto! Agnaldo, velho e irascível guerreiro, recordo dele sempre sentado à janela do casarão em nossas memoráveis assembleias. César, Tonho Leal, Salete, Herculano… são tantas e tantos… saudades!

Cada recanto tem uma história. Albertina com seu discurso forte, incendiando a plenária e Alba Correia, tal qual uma maestrina, procurando conduzir a luta com equilíbrio e harmonia entre os nossos pares. São tantos… Impossível nominar, os que permanecem, os que se foram.

Hoje nos reunimos na dor e indignação contra a Braskem destruidora da vida e dos governantes pela cumplicidade e omissão, pela atitude prepotente e criminosa para com a vida das pessoas, pelo desprezo à dor dos moradores dos três bairros, pelo encerramento de um ciclo de convívio social, econômico, político e afetivo das pessoas… pela usurpação do seu território para alimentar a ganância do Capital. Hoje Maceió sucumbe a vergonha de ver uma parte importante da Cidade das Águas virar uma faixa fantasma, sem som, sem voz, sem vida!

Dia triste… ( pandemia, covid -19, despejo) e eu isolada numa quarentena, sem sequer ter a chance de dar um abraço final. Só dor!

 

*Lenilda Lima é professora aposentada das redes básicas de ensino do Estado de Alagoas e do Município de Maceió. Já foi presidenta do Sinteal por duas gestões e atualmente está de volta à direção. É reconhecidamente uma figura pública de importância histórica no Estado de Alagoas.