2 de dezembro de 2020

CNTE lança Nota Pública em que acusa Governo Bolsonaro de publicar portaria “que vai zerar o reajuste do piso do magistério em 2021”

A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação – CNTE, publicou, nesta 4ª feira (02/12), em seu site, uma Nota Pública em que denuncia que o Governo Federal, leia-se “Governo Jair Bolsonaro”, ao publicar, em 25 de novembro de 2020, a Portaria Interministerial nº 3, que reduziu o valor anual mínimo por aluno do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB, “mantém a trajetória negacionista do governo Bolsonaro diante da crise do coronavírus no Brasil, e projeta, junto com outras medidas de arrocho fiscal, a inevitável (e arquitetada) desestruturação da escola pública brasileira, a partir de 2021”

Segundo a Nota da CNTE, o Governo Federal age para se vingar da derrota sofrida na aprovação da Emenda Constitucional nº 108 – que instituiu o Fundeb permanente -, e diz a Confederação que “sua irresponsabilidade [do Governo Bolsonaro] afeta não apenas a escola pública, como também grande parte dos estados e municípios do Brasil, que serão afetados imensuravelmente com desequilíbrios orçamentários”.

Segue a Nota Pública da CNTE enfatizando que, “para além desse ajuste imposto ao Fundeb – num momento delicado da conjuntura política, social e econômica –, a gestão Bolsonaro também contingenciou mais de 90% dos recursos do MEC destinados à educação básica em 2020 (exceto a complementação obrigatória ao Fundo da Educação Básica), e propôs no orçamento federal para 2021 a supressão de cerca de outros R$ 5 bilhões originalmente vinculados ao MEC”.

“O governo ainda vetou os dispositivos da Lei 14.040, que destinavam recursos do “Orçamento de Guerra” da União para financiar as redes escolares estaduais e municipais durante e após a pandemia da Covid-19, e tem atuado para desconfigurar os objetivos do novo Fundeb permanente durante a tramitação da futura Lei de regulamentação no Congresso Nacional. Os ataques à saúde não ficam para trás, tendo recentemente lançado um balão de ensaio para privatizar o SUS”, continua o documento da Confederação.

Além dos “ataques” acima expostos, a CNTE enfatiza que o Governo Bolsonaro mantém o que chama de “política antissistêmica” de enfrentamento da crise sanitária nas escolas, e mais que isso: 1) Impede a aprovação de projetos de lei no Congresso que pretendem incluir recursos da União no financiamento educacional para superar os efeitos da pandemia (PL 3.165/20 e outros); 2) Apoia a abjeta proposta parlamentar (prestes a ser protocolada) que visa flexibilizar o cumprimento da vinculação mínima constitucional à educação, em 2020; 3) Insiste em pautar a desvinculação permanente, total ou parcial, dos recursos constitucionais destinados à educação, colocando em risco o próprio Fundeb; e 4) Volta-se diuturnamente contra o aumento dos recursos financeiros para a educação pública, seja promovendo contingenciamentos e cortes orçamentários, seja compensando o acréscimo previsto com o novo Fundeb através de cortes em outras rubricas educacionais, ou mesmo propondo revogar por completo o Fundo Social do pré-Sal e a Lei 12.858, que reservam recursos para a educação, saúde e outras políticas sociais.

Quase em seu final, a Nota Pública da CNTE diz que, “na contramão de políticas que possam alavancar a economia, o emprego e a renda no Brasil, num momento em que o desemprego atinge taxas recordes (14,6%) e a inflação solapa a renda dos/as trabalhadores (24,5% a.a, IGP-M/FGV), o governo [federal] encaminhou ao Congresso Nacional projeto de reforma administrativa para diminuir postos de trabalho no setor público, privilegiando poucas carreiras “típicas de Estado” e apontando para ampla privatização de políticas essências como saúde e educação”.

A CNTE lembra que, no 1º semestre deste ano, os/as servidores/as públicos/as já haviam sido “vítimas de outra ação insana” da dupla Jair Bolsonaro & Paulo Guedes, respaldada pela aprovação da Lei Complementar nº 173, que “congelou as progressões nas carreiras dos/as servidores/as públicos/as das três esferas até dezembro de 2021”.

O documento da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, à qual o SINTEAL é filiado, alerta para o fato de que “o ultraliberalismo inconsequente de Bolsonaro e Guedes não tem limites e coloca em risco a sociedade brasileira. A pandemia e a fragilização das políticas públicas são prova disso, além de tantas outras irresponsabilidades cometidas contra o meio ambiente e a vida de centenas de milhares de brasileiros mortos pela Covid-19, intitulada de “gripezinha” pelo chefe de Estado do país”.

“Diante da gravidade desse cenário irresponsável criado pelo governo Bolsonaro”, a CNTE cobra do parlamento brasileiro “a aprovação de medidas que sustem imediatamente os efeitos da Portaria nº 3/2020”, de modo a impedir que “maiores absurdos sejam cometidos contra a educação brasileira e seus profissionais”. A CNTE alerta ser necessário “assegurar os recursos públicos suficientes para garantir educação de qualidade a todos/as, especialmente aos filhos e filhas da classe trabalhadora e aos/às próprios/as trabalhadores/as”.

Finalmente, na Nota Pública, a CNTE alerta também que, ao parlamento, também compete a “aprovação da lei de regulamentação do Fundeb permanente, que precisa assegurar expressamente a recepção da Lei 11.738 (piso salarial do magistério), até que outro dispositivo de valorização seja assegurado aos profissionais da educação”.  Segundo a Confederação, essa medida “é essencial para evitar quaisquer manobras com vistas a colocar em dúvida a vigência da Lei do Piso, em 2021, e/ou atrasar sua execução que deve ser perene”.

PONTOS CRUCIAIS

A Nota Pública da CNTE é encerrada com estas importantes observações (pontos cruciais) quanto aos efeitos práticos da Portaria Interministerial n° 3/2020:

  1. Todos os municípios brasileiros que recebem complementação estadual do Fundeb e os entes públicos (estados e municípios) que recebem complementação federal terão que devolver parte dos recursos recebidos desde janeiro de 2020. Embora o lapso temporal seja contestável à luz de princípios do direito financeiro e de legislações orçamentárias, o prejuízo será inevitável e poderá gerar colapso em várias redes de ensino. Nem mesmo a expectativa de ganho com o percentual extra de 2% da complementação da União para 2021 será capaz de suprir as perdas com a presente redução de 8,7% no custo aluno ano do Fundeb 2020. E soma-se a esse cenário trágico a redução das receitas tributárias nos estados, DF e municípios e a relutância da União em repassar recursos extras para financiar a educação em todo o território nacional. Ou seja: ao invés de ajudar os entes subnacionais no momento da pandemia, o governo federal impõe mais uma grave restrição orçamentária às administrações públicas, que certamente não conseguirão reabrir as escolas, quiçá honrar os compromissos salariais com seus servidores públicos. Trata-se de uma conjuntura de caos fiscal e social motivada pela ingerência da União sobre o Fundeb, especialmente por não ter observado os prazos e condições previstos no art. 6º c/c art. 4º da Lei 11.494, fato que enseja gravíssimo crime de responsabilidade!
  2. O piso salarial do magistério, que tinha atualização prevista na ordem de 5,9% para 2021, agora terá reajuste zero no ano que vem. E essa tendência de anular os ganhos salariais dos/as professores/as brasileiros/as segue na mesma direção da LC 173/2019. Caso a referida Portaria não seja revogada ou o Congresso não reveja a política de reajuste do Piso (fixando, por exemplo, o INPC + percentual de ganho real), será a primeira vez na história do Fundeb que os docentes da educação básica pública ficarão sem acréscimos em seus vencimentos, historicamente defasados sobretudo em comparação a outras profissões ou mesmo a docentes de outros países, conforme apontam as pesquisas da OCDE.

A educação e seus profissionais precisam ser respeitados! Sem trabalhador/a valorizado/a não se constrói educação de qualidade!

Brasília, 27 de novembro de 2020

Diretoria da CNTE

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DIEESE – Análise técnica

No documento, na verdade uma “análise técnica” intitulada “Queda no Valor Aluno Ano do Fundeb e Consequências para a Educação Básica – Investimento na Educação Básica Brasileira”, o DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), instituição de pesquisa, assessoria e educação do movimento sindical brasileiro, traz informações importantes (resumidas em destaques abaixo), ponto por ponto, sobre a diminuição do valor do custo-aluno e da queda brutal nos investimentos na Educação praticadas pelo Governo Federal.

Destaques:

  • A nova portaria do Governo Federal [Portaria Interministerial nº 3] reduz previsão do VAA (Valor Anual por Aluno) Fundeb de 2020 de R$ 3.643,16 para R$ 3.349,56 (uma redução no valor de R$ 293,60);
  • Desde que o Fundeb entrou em vigência será a primeira vez que o valor anual mínimo por estudante diminui em relação ao praticado no ano anterior;
  • De acordo com a nova estimativa, o investimento do Fundeb na educação cairá de R$ R$172,1 bilhões para R$ 160,9 bilhões, R$ 11,2 bilhões a menos que a previsão inicial;
  • A maior queda se dá pelo menor montante enviado pelos municípios, em consequência da crise sanitária. Anteriormente, estimava-se uma contribuição de R$ 157,9 bilhões oriundas dos 20% das cestas de impostos municipais e estaduais, e esse valor caiu para R$ 147,6 bilhões;
  • Por outro lado, a União se nega a contribuir com mais que o mínimo de 10% definido por lei, diminuindo assim a complementação de R$ 15,8 bilhões para R$ 14,8 bilhões;
  • Caso a União se comprometesse a garantir o VAA (Valor Anual por Aluno) Fundeb definido anteriormente, teria que arcar com uma complementação de 17,6%, cerca de R$ 26 bilhões. Vale lembrar que a lei do Fundeb define o percentual mínimo de 10%, não impedindo a majoração desses recursos;
  • O Piso do Magistério também sofrerá com essa diminuição, pois seu reajuste é dado pela variação do VAA Fundeb. Com o novo valor definido pela União, o PSPN será reajustado em 0% no ano de 2021.